Navegando pelo G1, encontrei outro artigo interessante do Blog de Silvio Meira, que fala sobre como (e até que ponto) a Internet têm modificado a nossa cultura, principalmente a partir da Web 2.0, que dá agora também à audiência uma certa liberdade de produção de informação.
Compartilho o texto com vocês:
A nova indústria cultural
Estamos vivendo o fim da industria cultural estabelecida a partir de Gutenberg. Uma outra está tomando, devagar, seu lugar. Que outra? E quando, e como?
Andrew Keen, autor do polêmico A Cultura do Amador, fez um sumário do texto em dez pontos, uma espécie de manifesto anti-web2.0. O subtítulo do livro diz quase tudo: como a internet de hoje está matando nossa cultura. O primeiro ponto do decálogo é… o culto do amador é a ilusão mais sedutora da utopia digital... pois sugere, de forma enganosa, que todos têm alguma coisa a dizer. Lá no fim, o autor diz que a conseqüência do descontrole dos desenvolvimentos digitais será a vertigem social,... pois tudo estará em movimento e será apenas opinião.
Theodor W. Adorno, o mais importante filósofo alemão do pós-guerra, escreveu um texto fundamental para o entendimento da “indústria cultural”, exatamente aquela que, segundo Keen, está sendo “destruída” pela internet. Segundo Adorno, a indústria havia limpado o “lixo” da cultura, domesticando, aperfeiçoando ou proibindo os amadores ou, na prática, a disseminação de sua produção. Ao mesmo tempo, a padronização, os estilos comuns e a massificação levariam, segundo o pensador, à comoditização da cultura, transformando-a em anúncio, ou quase. Era um pressentimento da primeira MTV. E no fim da Segunda Guerra, onde Adorno via também o fim do mercado livre.
De lá pra cá, o mundo mudou, caíram cortinas e muralhas e -- até por causa disso -- apareceu a internet, a máquina de inovação que, entre tantas outras coisas, também publica. Muito, tudo e de todo mundo. Nem todo mundo, claro, tem alguma coisa relevante a dizer para todo o resto do mundo, no sentido da indústria jornalística. Ela, aliás, já não derruba presidentes ou inicia revoluções como no passado. Mas todo mundo tem alguma coisa a dizer para algum público, nem que seja sua família e amigos. Pelo menos por algum tempo.
Nada é mais importante, em benefício do próprio futuro da indústria cultural, que quem queira se manifestar que o faça. Alto e bom som. E pra todo mundo. Quem quiser leia (veja, ouça…) e goste. Ou não. Problema de cada um. Só não venham limitar o nosso direito de dizer o que bem queremos.
Estamos vivendo apenas mais um estágio da "indústria cultural", agora veiculada pela web, onde os mecanismos de refinamento que a cultura sempre teve, para selecionar e separar o que era "significativo" do que não era foram descontrolados. Como em um famoso cartoon do começo da internet, qualquer um pode ser relevante: no momento, basta ter audiência. Mas o momento muda e o refinamento acontece, passo a passo, à medida em que vamos entendendo o que e quem vale a pena ler, ver ou ouvir. E trata-se de um processo educativo para todos.
A diferença, hoje, é que a prensa (virtual) de Gutenberg está em sua versão web 2.0, democratizando os meios de produção de informação a níveis nunca antes imaginados pela tal "indústria cultural". É isso que gera o caos "denunciado" por Keen em seu manifesto. Mas não há, nem precisa haver, desespero. Não estamos chegando no fim do mundo, mas no começo de um novo tempo. E o tempo, a prática, os processos de seleção natural, em conjunto, vão criar as novas relevâncias e restabelecer alguma ordem. Não, e nunca mais, toda a ordem que já existiu quando os donos de jornais e editores decidiam o que imprimir e distribuir.
Assim como Gutenberg desorganizou o poder de reis, igreja e mosteiros com a prensa de tipos móveis, a indústria cultural está sendo modificada para sempre pela liberdade criada pela web. As empresas, suas estruturas e práticas organizacionais vão pela mesma estrada. Para sempre. Sem volta. Mas não estamos indo para o caos puro e simples, e sim para um mundo muito mais diverso, sofisticado e complexo… e mais, bem mais difícil de entender e administrar. Bem-vindos. É só mais uma parte do futuro começando…
Silvio Meira
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